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Avaliação Sistêmica e Avaliação da Aprendizagem nos Ciclos de Formação Básica

1. REPENSANDO A AVALIAÇÃO

PROBLEMAS E NECESSIDADES

Com a implantação do regime de progressão continuada no ensino fundamental das escolas públicas estaduais de Minas e sua organização em ciclos de formação básica, a manutenção do programa de avaliação sistêmica torna-se ainda mais importante. Sem dúvida, essas duas medidas, por traduzirem uma mudança da cultura profundamente estabelecida na nossa tradição escolar, geram expectativas e insegurança tanto nos educadores quanto nos próprios pais de alunos. Por isso mesmo, a sua implementação precisa ser cuidadosamente monitorada e avaliada, com a finalidade de determinar os seus efeitos sobre o desempenho dos alunos e evitar prejuízos ao seu desenvolvimento. Para isso, no entanto, é preciso introduzir gradativamente mudanças na metodologia adotada, tornando o processo de avaliação sistêmica mais apto a nos informar sobre a eficácia do trabalho escolar e os progressos alcançados pelos alunos.

Por outro lado, essas medidas colocam questões novas que não podem ser ignoradas ao se planejar e realizar a avaliação da aprendizagem. Se, até agora, essa avaliação visava à instrumentalização de cada professor para, ao final de cada ano, poder decidir sobre a aprovação ou repetência dos estudantes, a partir das mudanças introduzidas na escola a situação tornou-se inteiramente diferente. Não se trata mais de decidir sobre "quem passa" ou "quem não passa", quem tirou maior nota ou como os alunos se classificam com base no desempenho nas provas aplicadas. O que se pretende é saber quão proveitosa está sendo a experiência escolar para cada aluno; o que e como cada um deles aprendeu; quais os métodos e as circunstâncias mais favoráveis ao seu desenvolvimento e que progressos ocorreram; que habilidades, competências e interesses demonstram ter e que necessidades e deficiências podem ser constatadas e precisam ser atendidas ou supridas.

A avaliação da aprendizagem, portanto, deverá cumprir um novo papel em um novo contexto. Um contexto em que a escola precisa, cada vez mais, preparar-se para reconhecer as diferenças e saber lidar com elas; para conviver com múltiplos interesses, com diferentes pontos de vista e distintos ritmos de aprendizagem; para compreender as mudanças cognitivas e saber tirar proveito pedagógico das transformações do real, uma vez que a vida social - dinâmica e diversificada - tem a sua cadência determinada, sempre mais, pelas exigências e ritmos das transformações científicas e tecnológicas.

Nessa nova escola, o propósito deve ser o de assegurar aos alunos as condições para que possam aprender aquilo que é indispensável à sua formação enquanto seres humanos (construção das estruturas cognitivas que lhe permitem compreender o real), enquanto cidadãos (capacidade de cumprir os seus deveres, de fazer valer os seus direitos e de exercer as funções políticas requeridas pela sociedade) e enquanto profissionais. Esses novos rumos da Educação, orientados pelas necessidades impostas pelos novos processos de produção, pelos novos serviços e pelas novas estruturas de trabalho, apontam para a formação de profissionais versáteis, com capacidade de decisão frente a situações complexas, com senso de responsabilidade, autonomia, autoconfiança, espírito crítico e autoconsciência, cooperação e capacidade de comunicação.

Se o que se esperava de todo professor, até agora, em relação à competência avaliativa, é que fosse capaz de elaborar "boas provas", apenas isso já não é mais suficiente. Exige-se dele que conheça os seus alunos, que tenha sensibilidade para perceber mudanças e que tenha compromisso com o seu desenvolvimento; que conheça o processo de aprendizagem e de elaboração do conhecimento; que saiba aquilo que vai ensinar e como deve ensinar.

Isso implica um modo inteiramente novo de conceber e de realizar a avaliação da aprendizagem. Uma avaliação que seja contínua (como o é o processo de aprendizagem), e que seja a favor do aluno, isto é, um instrumento e uma ocasião para o seu autoconhecimento e crescimento pessoal; que permita ao professor fazer um diagnóstico tanto do que foi aprendido quanto do que não foi, identificando os diferentes fatores que possam ter contribuído para os resultados observados. E, também, uma avaliação que permita ao aluno conhecer o seu modo próprio de ser e de pensar o mundo, os seus "erros" e sucessos. Isso é condição para que, através de um processo de "tomada de consciência" , possa tornar-se observável o que antes não tinha significado para ele e, com isso, ultrapassar o estado atual de conhecimento, alcançando outro, mais equilibrado, do ponto de vista psicológico e epistemologicamente mais satisfatório.

Mudanças dessa ordem e dessa natureza não poderão ser feitas senão através de uma estratégia que conduza a uma mudança de cosmovisão. E, como sabemos, não se muda uma visão de mundo facilmente. Por isso, nesse documento começaremos a desenvolver um esforço de "tomada de consciência" dos pressupostos e procedimentos usualmente adotados nas avaliações escolares, procurando identificar os mitos e equívocos para, só então, passar à construção de um novo modo de avaliar, mais adequado à nova realidade escolar, às novas exigências formativas e mais compatível com um novo modo de pensar a avaliação da aprendizagem.